*Professora da Escola Secundária Sá de Miranda, ano letivo 2015/16
*Aluna da Escola Secundária Sá de Miranda, nos anos letivos 1991/92 a 1996/97
O nosso Museu reúne uma coleção científica de material didático-pedagógico de diversas áreas do conhecimento: biologia, eletrotecnia, etnografia, física, geografia, geologia, história e química (peço desculpa, se existirem outras mais, que ainda, no momento, desconheço). Mas, todos os dias aprendo um pouco mais, quer com o espólio do nosso Museu, quer com todo o trabalho de investigação, quer com os testemunhos e partilha dos colegas de trabalho, quer com todos aqueles que nos visitam.
A coleção que temos é, maioritariamente, oriunda dos Gabinetes de História Natural, de Físico-Química e de Geografia do Liceu, desde a sua fundação há 180 anos [completá-los-á a 17 de novembro de 2016] até aos nossos dias e, que não é utilizada atualmente (pelo menos de forma sistemática), em sala de aula. Congrega também alguns outros objetos do antigo Colégio do Espírito Santo, que se encontravam no Gabinete de História Natural do Colégio (cf. Fig. 1) e que funcionou desde 1872 até outubro de 1910, nas atuais instalações da Escola Secundária Sá de Miranda.
Fig. 1 - Gabinete de História Natural do Colégio do Espírito Santo
O espólio do Museu é dotado de uma coleção notável de objetos antigos da casa francesa Deyrolle, em Paris, que é a maior casa especializada em taxidermia, fundada em 1831 e, que a 1 de fevereiro de 2008, sofreu um grande incêndio, tornando os espólios desta casa francesa, distribuídos pelo mundo, especialmente os mais antigos, ainda mais valiosos, como é o caso do nosso. Na nossa Biblioteca existe um catálogo, original, de 1908, dos materiais que esta casa francesa distribuía pelo mundo e que tem sido utilizado também para auxiliar na identificação e catalogação de algumas peças (cf. Fig. 2).
Fig. 2 - Catálogo da Casa Francesa Deyrolle, 1908
A taxidermia é uma forma de conservação de animais vertebrados com o intuito de criar coleções científicas ou conservar espécimes ameaçados de extinção. Este processo envolve conhecimentos de várias áreas para além da biologia, como é caso da química, da anatomia, da ecologia, das artes plásticas, entre muitas outras. As técnicas que são utilizadas são várias e, incluem a preparação de esqueleto e da pele assim como, a montagem do ser vivo no seu estado natural, reconstituindo quer as características físicas, quer o seu habitat, quando possível. Aproveitam-se sempre as partes duras dos seres vivos, que não se decompõem e, que resistem às amplitudes térmicas ditas normais. A coleção existente no Museu resulta, de seres vivos recolhidos no seu meio e que foram preparados para que resistissem ao longo de vários anos. Para além de animais, podem também fazer parte desta tipologia (taxidermia) alguns resquícios das atividades desses mesmos animais, como é o caso de ninhos, ovos, ou pegadas.
O espólio do Museu, em termos de Ciências Naturais e de espécimes taxidermizados, engloba vários tipos de aves, mamíferos, répteis, anfíbios, peixes e artrópodes. Existem também alguns vestígios da sua atividade, nomeadamente, ninhos com/sem ovos.
Devido ao seu anterior estado de conservação, as aves foram recentemente restauradas, valorizando ainda mais a coleção.
Todo este conjunto de seres vivos taxidermizado permite, consoante a idade de quem nos visita estabelecer, por exemplo: relações entre os seres vivos e o seu habitat; as relações bióticas que estes seres vivos estabelecem entre si; as características que apresentam (tais como: presença de penas; presença de pelo; presença de escamas; existência de bico curto e adunco; presença de bico comprido e achatado; existência de membrana interdigital; tamanho das patas; ausência de olhos; n.º de dentes, sua disposição e tipologia...) e o tipo de alimentação que possuem ou o habitat que ocupam; as semelhanças e diferenças que apresentam; categorias taxonómicas e classificação de Whittaker; as curiosidades que alguns apresentam e qual a sua função (tais como, formas de camuflagem, defesa, acasalamento)...
No Museu, destaque também para a coleção de esqueletos, quer completos, quer incompletos, como é no caso destes últimos, vários crânios e também de uma vértebra de cachalote (ME/402849/254 - cf. Fig. 3), esta última doada por um antigo colega da escola, Dr. João Rodrigues (atualmente a trabalhar, no Agrupamento de Escolas Alberto Sampaio). Estes esqueletos permitiam o estudo anatómico quer da espécie humana - Homo sapiens (ME/402849/251 - cf. Fig. 4) - assim como a comparação (anatomia comparada) com outros esqueletos, como é o caso, por exemplo, do esqueleto de gorila - Gorilla gorilla (ME/402849/252 - cf. Fig. 5) - existente no nosso Museu. Também a observação dos crânios possibilitava ainda o estudo da dentição de diversos seres vivos e, deste modo, deduzir-se o tipo de alimentação de cada espécie.
Fig. 3 - ME/402849/254 - Vértebra de Cachalote oriunda dos Açores
Fig. 4 - ME/402849/251 - Esqueleto de Fig. 5 - ME/402849/252 - Esqueleto de
Homo sapiens Gorilla gorilla
Não menos relevante é uma coleção de modelos anatómicos elaborados em diferentes materiais (tela, gesso, cerâmica, polímeros) e que também demonstram a evolução ao longo do tempo, no que diz respeito aos materiais utilizados e há importância dada ao estudo das características anatómicas dos diferentes seres vivos.
Destaque também para os espécimes conservados em líquido, do qual o nosso Museu tem um espólio riquíssimo, que vai desde a conservação total de seres vivos a apenas alguns órgãos. É exemplo disso mesmo, a conservação total de um feto em formol, onde é possível a observação dos braços, das mãos, das pernas, dos olhos, do nariz e da boca. E por que não aproveitarmos o facto de termos este material para por exemplo, in loco: iniciar uma aula de ética?; debatermos a legitimidade ou não do aborto [criando no aluno o espírito crítico, a defesa dos seus argumentos, perante os seus pares e, o respeito pela opinião dos outros, quando contrária]?; um debate no âmbito do Projeto de Educação Sexual, no Ensino Secundário?...
Outro objeto que causa impacto a quem nos visita e, também conservado em líquido, é o do sapo-parteiro-comum - Alytes obstretricans (ME/402849/272 - cf. Fig. 6) - que tem a particularidade, do macho, após os ovos serem fertilizados, enrolar o cordão envolvente destes, nas patas traseiras e andar com eles até à altura daeclosão (aproximadamente um mês), protegendo-os dos predadores, dos fungos e da seca. É devido a esse facto que apresenta verrugas na região lombar, para que os consiga transportar mais facilmente, sem os perder. Esta espécie é, predominantemente, terrestre e, só vive na água na época da reprodução. Quando o desenvolvimento dos embriões chega ao fim, este sapo, aproxima-se então, das águas calmas, onde as cascas dos ovos se rompem, ficando os girinos em liberdade. O tamanho da cabeça destes sapos é bastante grande atendendo à dimensão do seu corpo. Os olhos são grandes e com pupila vertical, em forma de fenda. Este objeto já fazia parte do espólio do Liceu em 1901, tendo sido uma oferta de S. Motta, conforme comprova o Catálogo arquivado na nossa Biblioteca (cf. Fig. 7).
Fig. 6 - Alytes obstretricans conservado em líquido
Fig. 7 - Catálogo de 1901 do Liceu, em arquivo na nossa Biblioteca
Muitos outros objetos podem ser apreciados na área da Biologia, na exposição permanente do Museu, mas só uma visita detalhada para poder constatar ao vivo a magnificência do espólio.
Também logo à entrada do espaço físico principal do Museu uma pequena amostra, num armário, do que existe em termos do património geológico.
Na exposição permanente, apesar de também haver uma coleção rica, na área da Geografia, apenas uma ínfima amostra, do que existe. Aí destacam-se duas belíssimas peças: um globo terrestre (ME/402849/161 - cf. Fig. 8); um globo celeste (ME/402849/160 - cf. Fig. 9), onde estão representadas as principais constelações, através de simbologia mitológica. Este último, costuma encantar as nossas crianças, principalmente, as mais novas, que logo se "atropelam" curiosas com um conjunto de questões pertinentes. Logo atrás, uma pequena amostra de uma coleção de quadros representando os povos da Terra e, mais um local, onde se quisermos poderemos iniciar uma aula e voltar a dar vida aos objetos do nosso Museu.
Fig. 8 - ME/402849/161 - Globo Terrestre
Fig. 9 - ME/402849/160 - Globo Celeste
Nas áreas da Física e da Química o encanto começa pela antiga bancada do Laboratório, que ocupa o espaço central do Museu. Em seguida, as Tabelas Periódicas de 1912 e de 1955 não passam despercebidas pela sua dimensão, por serem bem diferentes entre si e por serem em madeira pintadas. A de 1912 (ME/402849/65 - cf. Fig. 10) apresenta apenas os pesos atómicos aproximados, enquanto, a de 1955 (ME/402849/66 - cf. Fig. 11) já é um verdadeiro sistema periódico dos elementos.
Fig. 11 - ME/402849/66 - Sistema Periódico dos Elementos (1955)
A Máquina de Joule também chama a atenção dos nossos visitantes, assim como, a Máquina elétrica de Carrè. Mas, ao nível destas duas ciências, esta é só uma pequena fração do que existe na nossa escola, pois o acervo é muito maior, até porque já no final do séc. XIX, quer no Liceu quer no Colégio do Espírito Santo era prática comum, os alunos realizarem atividades experimentais, conforme também comprovam registos fotográficos da altura do Colégio do Espírito Santo (cf. Fig. 12 - Preparação do Fósforo, pelos alunos da 6.ª classe, do Colégio do Espírito Santo).
Fig. 12 - Preparação do Fósforo - Trabalhos Práticos pelos alunos da 6.ª classe - Colégio do Espírito Santo
Algum dos instrumentos científicos adquiridos quer para a química quer para a física, quer para outras áreas do saber são de origem alemã, existindo em arquivo, um catálogo de 1928, na nossa Biblioteca, que comprova isso mesmo (cf. Fig. 13).
Fig. 13 - Catálogo de Material de Origem Alemã arquivado na nossa Biblioteca, 1928
No Museu pode ainda ser observado o mobiliário, nomeadamente, duas carteiras antigas dos nossos alunos e, os móveis antigos que albergam o nosso espólio e, que foram restaurados.
Mas, o nosso Museu não se cinge a um só espaço físico, pois está também espalhado por toda a escola, em contacto direto com os nossos alunos, com os nossos docentes, assistentes operacionais e restante comunidade educativa, que nos visita. Há materiais didáticos à entrada da Direção, na Sala Oval, na sala de Geografia, no Salão Nobre, no Gabinete Médico, no corredor dos Laboratórios (expositores com materiais) e nos próprios Laboratórios. Parte da coleção está ainda guardada e devidamente acondicionada, sendo apenas exposta, nas exposições temporárias.
O Museu está aberto aos alunos, mas também à restante Comunidade, de segunda a sexta. Este ano, já foi possível receber os alunos: do 9.º ano da Escola de Palmeira, no Dia da Escola - 17 de novembro - com visita guiada ao Museu; de todos os quartos anos do nosso Agrupamento, com o forte envolvimento dos colegas de Biologia e Geologia - Dr. Sérgio Leite e Dr.ª Cristina Fertusinhos - que se empenharam, ativamente, na dinamização das atividades no Museu e também nas atividades Laboratoriais que se realizaram no mesmo espaço e em inter-relação de conteúdos e materiais, nos dias 20 e 27 de janeiro; de duas turmas de 6.º ano no dia 18 de fevereiro, com visita guiada ao Museu; a algumas alunas de 12.º ano, com visita guiada ao Museu. Para além disso, visitaram o nosso Museu os alunos com Necessidades Educativas Especiais, quer acompanhados da Psicóloga do IRIS, Dr.ª Raquel, quer alguns deles a título individual. E é sempre muito bom recebê-los e fazê-los sentirem-se que esta casa é também deles. No mês em que escrevo, os alunos das turmas 10.º 10, 11.º 10 e 12.º 8, acompanhados do Dr. Manuel Braga da Costa, por iniciativa própria, têm aparecido para desenharem parte do espólio, numa atividade que se tem mostrado muito profícua. Muitos deles têm-se demonstrado bastante motivados e, entre traços e rabiscos, borracha, olhar novamente para o objeto, mais um traço, torcer o sobrolho, voltar a apagar, voltar a desenhar, lá tentam procurar mais informações sobre o que estão a desenhar, tentando compreender se aquilo que observam é mesmo assim, quando aquele ser, ainda se encontrava vivo. E, voltam a dar "vida" a cada peça e, ao Museu (cf. Fig. 14 e 15).
Fig. 14 - Ilustração Científica, da aluna Filipa Duarte, n.º 6, do 10.º 10, de Alytes obstretricans (sapo-comum-parteiro) - 1.ª aula
Fig. 15 - Ilustração Científica, da aluna Filipa Duarte, n.º 6, do 10.º 10, de Alytes obstretricans (sapo-comum-parteiro) - 2.ª aula
Também já visitaram, a título individual o Museu, este ano letivo: Encarregados de Educação, ex-alunos, docentes do Agrupamento, Doutores da Universidade do Minho, trabalhadores da Câmara Municipal de Braga, cidadãos de Braga, representantes do Museu da Assembleia da República.
No processo de catalogação está-se a inventariar os objetos consoante as orientações do Ministério da Educação, procedendo-se para isso a um processo de investigação de cada peça e, posteriormente, à sua descrição. Após o preenchimento da ficha de cada objeto está-se a elaborar uma ficha simplificada para impressão, para que quem nos visite a título individual e, que não tenha a possibilidade de ter visita guiada ou não a deseje, possa usufruir ao máximo das potencialidades do nosso Museu. Para além disso, a equipa da Biblioteca está, no momento, a construir este Website, onde pretende partilhar toda a informação recolhida em termos de catalogação. A Dr.ª Cândida Batista e eu estamos a construir o Website, colocando lá toda a informação recolhida até ao momento, sobre o nosso Museu e as peças já inventariadas e catalogadas e, o Dr. Carlos Roncon está a proceder ao registo fotográfico de cada peça, para que cada ficha de objeto fique completa.
E, porque o Museu é de todos e para todos, não poderia deixar de agradecer a todos aqueles que até ao momento de algum modo colaboraram de alguma forma para que neste ano letivo, o Museu ganhasse visibilidade perante todos.
Concluindo, o Museu é um local de todos e para todos. Onde a colaboração de todos é bem-vinda e a partilha de conhecimento de todos também!
Ao longo de 180 anos assistimos a diferentes reformas curriculares, que estão bem presentes no acervo do nosso Museu. Neste conseguimos compreender, que os programas não são estanques, ao longo da nossa história educativa. Neste conseguimos estabelecer uma ponte entre o mundo natural, o seu estudo e o conhecimento. Podemos aprender nele, biologia, geologia, geografia, história, física, química, a desenhar, desenvolver o espírito crítico, a respeitar a opinião dos outros... E, tudo isto a partir de um único espaço...
Os nossos antigos alunos puderam observar e manusear, ao longo dos tempos, vários espécimes de difícil acesso, facilitando a aprendizagem de conteúdos programáticos. Os atuais também o podem fazer!... Os seus pais e restante Comunidade Educativa também. Venham daí! Aguardamos a vossa visita!
Cabe-nos a todos nós, fazer deste espaço, NOSSO!
AESM, 26/02/2016
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